terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Ainda o riso - Deméter e uma sexualidade que ri

O livro reúne livres interpretações de inspiração junguiana de histórias e narrativas arquetípicas sobre o feminino e suas expressões. Trata-se de Mulheres que correm com os lobos da poeta-psicanalista Clarissa Estès.

Presente de amiga rosa-leoa-loba-girafa :)

A leitura se encaminha para o final e já passei por um bocado de mulheres mexendo em si mesmas por dentro e por fora. A proposta-partida é excelente: mulheres e lobos têm um comportamento com semelhanças surpreendentes e pulsa nesta semelhança um elemento selvagem, alcançável apenas na aceitação de uma velha senhora "subterrânea" na psique, no río abajo río, aquela que chama e solicita, lá por debaixo de várias camadas de... Bem, poderiam ser camadas de qualquer coisa. Esta mulher é La que sabe.

Mas eu preciso mesmo é falar do capítulo 13, intitulado "O cio: a recuperação de uma sexualidade sagrada".
Conta-se que a deusa grega da terra, Deméter, caiu em depressão depois que sua filha desapareceu. Ela havia sido raptada por Hades, deus do inferno. A única coisa que consegue novamente animá-la, depois de tristes tempos de busca mal-sucedida pela filha, é uma outra mulher, ou "espécie de mulher" - Baubo, uma fêmea - que "não tinha nenhum tipo de cabeça, seus mamilos eram seus olhos e sua vulva era sua boca" que aparece dançando e contando piadas picantes até que consegue fazer Deméter rir. 
Assim acaba por reanimá-la mais uma vez. 

Para viver, talvez.

"Foi com essa
boquinha que ela começou a regalar Deméter com algumas piadas picantes e
engraçadas. Deméter começou a sorrir, depois deu um risinho abafado e em seguida
uma boa gargalhada. Juntas, as duas mulheres riram, a pequena deusa do ventre,
Baubo, e a poderosa deusa mãe da terra, Deméter."

Nada poderia ser melhor que isso, a não ser a história do "Coiote Dick", uma história dessas como a de Baubo, hein Clarissa? ;)
De toda maneira uma história que seria enforcada pela minha paráfrase. 

Bom divertimento:

"Era uma vez Coyote Dick, e ele era tanto a criatura mais esperta quanto a mais
tonta que jamais se podia esperar encontrar [...] Bem, um dia quando Coyote Dick estava dormindo, seu pênis ficou realmente
entediado e resolveu abandonar Coyote para viver sozinho uma aventura. Foi assim
que o pênis se soltou de Coyote Dick e saiu correndo pela estrada. Na realidade, ele
pulava pela estrada afora já que possuía só uma perna.
E ele foi pulando e pulando, e se divertindo até que saltou da estrada e entrou
na floresta, onde — Ah, não! — ele pulou direto numa moita de urtigas.
— Ai! — gritou ele. — Ai, ai, ai! — berrou ele. — Socorro! Socorro!
O barulho dessa gritaria toda acordou Coyote Dick e, quando ele estendeu a
mão para dar partida no coração com a manivela, como de costume, viu que ela não
estava mais lá. Coyote Dick saiu correndo pela estrada, segurando-se no meio das
pernas, e afinal encontrou seu pênis passando pela maior dificuldade que se pudesse
imaginar. Com grande delicadeza, Coyote Dick tirou seu pênis aventureiro do meio
das urtigas, acarinhou-o, tranqüilizou-o e o devolveu ao seu lugar certo.
Old Red ria como um louco, com acesso de tosse, olhos saltados e tudo o mais.
— Essa é a história do velho Coyote Dick.
— Você se esqueceu de contar o final — repreendeu-o Willowdean.
— Que final? Já contei o final — resmungou Old Red.
— Você se esqueceu de contar para ela o verdadeiro final da história, seu
porcaria.
— Ora, se você se lembra assim tão bem, então conte você mesma. — A
campainha tocou e ele se levantou da cadeira desconjuntada.
Willowdean olhou direto para mim, e seus olhos cintilavam.
— O final da história é a moral. — Nesse instante, Baubo apoderou-se de
Willowdean, pois ela começou a dar risinhos, a rir abertamente e afinal a gargalhar
tanto, e até com lágrimas, que levou dois minutos para conseguir dizer as duas
últimas frases, já que repetia cada palavra duas ou três vezes enquanto tentava
recuperar o fôlego.
— A moral é que, mesmo depois de Coyote Dick sair do meio das urtigas, elas
fizeram seu pau coçar feito louco para todo o sempre. E é por isso que os homens
estão sempre chegando perto das mulheres e querendo se esfregar nelas com aquele
olhar de "Estou com uma coceira". Pois é, aquele pau universal está coçando desde a
primeira vez que fugiu do dono.
Não sei o que deu em mim, mas ficamos ali sentadas na cozinha, rindo aos
guinchos e batendo na mesa até praticamente perdermos o controle dos músculos.
Depois, a sensação me pareceu semelhante àquela de ter comido um bom pedaço de
raiz-forte. É esse o tipo de história que eu realmente acho que Baubo contou. Seu
repertório inclui qualquer coisa que faça as mulheres rirem desse jeito, desenfreadas,
sem ligar para as amídalas aparecerem, com a barriga solta, com os seios balançando.
Há algo numa risada sexual que é diferente de uma risada sobre temas mais
educados. Uma risada "sexual" parece chegar longe e fundo na psique, sacudindo
todos os tipos de coisas, tocando nos nossos ossos e fazendo com que uma sensação
agradável corra por nosso corpo. Ela é uma forma de prazer selvagem que está à
vontade no repertório psíquico de qualquer mulher."

Ahhh... as boas morais!
sEM MAIS...

Referência:
ESTÈS, Clarrisa P. Mulheres que correm com os lobos: mitos e histórias do arquétipo da mulher selvagem.Rio de janeiro: Rocco, 1994. p.416-429.  

 



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